À primeira vista, o Smart Water Management (SWM) e a Economia Circular podem soar como panaceias. A corrida pela segurança hídrica – a disponibilidade confiável de uma quantidade e qualidade aceitáveis de água para saúde, meios de subsistência e produção – desencadeou uma infinidade de teorias e soluções. Não devemos esquecer que a crise hídrica é tanto uma crise de governança quanto uma crise sistêmica. Além disso, uma ampla gama de melhorias é necessária para garantir a segurança hídrica, tanto em termos de tecnologia quanto de gestão.

Neste post, reviso dois tópicos de tendência que afetam a água: Gestão Inteligente da Água e Economia Circular. Mas primeiro é importante entender a gestão dos recursos hídricos e seu impacto no meio ambiente e na nossa economia.

Gestão de Recursos Hídricos

Originalmente, a gestão de recursos hídricos foi desenvolvida principalmente para o consumo humano. Essa mentalidade criou um processo linear de gestão da água em todo o mundo.

As etapas tradicionais são captação de água, tratamento, consumo, tratamento de efluentes e descarte.

Captação de água

Há desafios em cada uma dessas etapas de gestão da água. Na etapa de captação, onde a água é coletada pela paisagem natural, o estresse hídrico é um grande problema em várias regiões. A água não é igualmente distribuída. Os centros urbanos, marcados pela alta densidade populacional, sofrem com a falta de água. Outro fator que impacta o estresse hídrico é a má qualidade dos corpos hídricos.

Tratamento de Água

Na segunda etapa, a água é tratada em uma estação de tratamento de água (TTP). A mentalidade linear dos planos conservadores de planejamento e gestão da água significava que o foco era alcançar padrões de consumo de água limpa. Em alguns países, a água tratada para padrões de água potável é usada para outros fins além da bebida, como usos industriais. O uso de água potável para diferentes propósitos causa perdas econômicas, energéticas e ambientais.

Distribuição de Água

Durante a fase de distribuição de água, um grande volume de água é perdido antes de chegar às torneiras. Em alguns países cerca de 40% da água é perdida devido a vazamentos e rajadas de tubulação. Falhas na rede podem levar a interrupções no fornecimento de água. A perda de serviço pode ter um impacto econômico significativo: perda de água tratada, aumento dos orçamentos de manutenção, horas extras para o pessoal de serviço, interrupções no tráfego e nos negócios e danos à propriedade privada.

As empresas responsáveis pelas redes de abastecimento de água passam por um enorme esforço para planejar de forma otimizada os reparos de seus ativos críticos, como tubulações, válvulas, estações de bombeamento e hidrômetros.

Durante a fase de distribuição de água, um grande volume de água é perdido antes de chegar às torneiras.

Recuperação de Água

Depois de distribuída e consumida, a água entra na fase de recuperação da água – também conhecida como fase de tratamento de efluentes – onde é finalmente descartada em estações de tratamento de efluentes. O tratamento de águas residuais é um processo usado para remover contaminantes de águas residuais e convertê-los em um efluente que pode ser devolvido ao ciclo da água. O descarte de águas residuais nem sempre ocorre na mesma bacia hidrográfica onde aconteceu a captação. A transferência de grandes volumes de água de fontes distantes também tem um impacto ambiental e econômico substancial.


Assista à entrevista de Elisa Stefan sobre a importância dos dados integrados:

A água reutiliza a solução?

Conferência Internacional das Nações Unidas sobre Água e Meio Ambiente (ICWE), realizada em 1992, representa uma mudança na mentalidade linear descrita acima com princípios que estabeleceram critérios básicos para a gestão dos recursos hídricos: “A água doce é um recurso finito e vulnerável, essencial para sustentar a vida, o desenvolvimento e o meio ambiente” e “a água tem valor econômico em todos os seus usos concorrentes e deve ser reconhecida como um bem econômico”.

Esses dois princípios moldaram a tomada de decisão subsequente sobre a gestão dos recursos hídricos, estimulando o uso parcimonioso da água e emprestando ao elemento as conotações de uma “mercadoria” como ouro ou petróleo.

Isso iniciou uma mudança de mentalidade da visão tradicional e linear que expliquei acima. No entanto, esse conceito ainda não foi amplamente aceito.

Tom Freyberg explica isso em seu post: Por que o reúso de água é a chave para um futuro circular. De fato, vários dos problemas listados acima podem ser resolvidos quando um sistema de reutilização de água é introduzido, tais como:

  • A introdução de sistemas de água reutilizados impacta positivamente a disponibilidade hídrica das bacias, pois atuam para reduzir diretamente a necessidade de retirada de água e diminuir o volume de efluentes devolvidos. Isso permite que um volume maior de água esteja disponível para outros usos na bacia hidrográfica. O efluente higiênico tratado não é mais um descarte, mas um recurso hídrico com uso potencial para fins específicos.
  • Outro impacto positivo é o benefício ambiental, pelo qual a água da estação de tratamento de águas residuais não é mais descarregada nos rios, o que reduz principalmente o insumo de nutrientes em corpos receptores, aumentando assim a disponibilidade de água em termos de qualidade para outros usos.

Como resultado, para aumentar a disponibilidade de água é de suma importância considerar o reaproveitamento da água. No entanto, o reaproveitamento da água não é a única opção. Os autores José Carlos Mierzwa e Ivanildo Hespanhol, da Universidade de São Paulo, comentam o seguinte:

“(…) A prática do reúso não deve ser considerada como objetivo principal de um modelo de gestão de água e efluentes (…). Isso também se justifica pelos investimentos necessários para adaptar as características dos efluentes às exigências de qualidade da água, bem como pelo fluxo a ser tratado. Além disso, a prática em questão não é tão imediata quanto se pode imaginar, uma vez que a água reutilizada deve ter características físicas, químicas e biológicas adequadas para cada uso. Deve-se considerar também que a concentração de certos contaminantes pode aumentar em cada ciclo de reutilização. Se esses pontos não forem observados e a prática de reutilização for adotada de qualquer maneira, todas as atividades em que a água de reaproveitamento é aplicada ficam comprometidas.”

O conceito de economia circular baseia-se na sustentabilidade econômica e ambiental. E como tal, o reaproveitamento de água nem sempre será a melhor opção. Cada cidade precisa ser analisada para identificar a solução que mais se adequa a ela. Não é apenas o processo que precisa mudar de linear para circular, mas também a maneira de pensar em soluções. É necessário pensar de forma não linear e não reducionista. As soluções precisam ser integradas e escolhidas com base em se garantem os maiores níveis de sustentabilidade.

O reaproveitamento da água explicou. Crédito: Agência de Proteção Ambiental dos Estados Unidos

Gestão inteligente da água

Para apoiar o processo de tomada de decisão, é primordial avaliar os dados. Este é o ponto de convergência entre a Economia Circular e a Gestão Inteligente da Água (SWM). A gestão da água tem sido desenvolvida em um processo linear, como consequência do processo de tomada de decisão que vinha sendo realizado sem uma visão completa de todo o processo. Para resolver esse problema, os Sistemas Inteligentes de Gestão de Água (SWMS) estão sendo adotados pelas concessionárias de água em todo o mundo.

Os sistemas inteligentes de gerenciamento de água são tão inteligentes?

Há uma ampla gama de SWMS que contribuem para resolver os diversos problemas hídricos acima. Algumas vantagens do uso do SWMS são: análise de big data para melhorar o processo de tomada de decisão, melhorando a qualidade dos dados, a integração e maior agilidade.

No entanto, o SWMS pode trazer mais problemas do que soluções se alguns pontos cruciais não forem considerados:

1) Usabilidade

Não vale a pena resolver um problema enquanto cria novos problemas. Alguns sistemas podem ser complexos e difíceis de usar. A necessidade de contratar um profissional dedicado ao uso do sistema pode ser um sinal de que ele não está bem desenhado. Ou então pode ser apenas outra peça de tecnologia que fica na sua prateleira. Como resultado, é importante avaliar a usabilidade de um determinado SWMS antes de incluí-lo em um projeto.

2) Suporte Técnico

Da mesma forma, ter suporte técnico é primordial, pode surgir algum problema. O suporte pode ter diferentes formatos: equipes de consultoria, bots/inteligência artificial, fóruns ou blogs. Portanto, antes de adotar um SWMS, verifique a disponibilidade completa de suporte.

3) Melhoria Contínua

Eventualmente, você vai se encontrar dizendo a seguinte frase ao usar um Sistema de Gestão Inteligente de Água: “Seria bom se este passo fosse diferente”. Um bom SWMS é aquele que está sendo constantemente atualizado para atender às necessidades de seus usuários. Avalie se o sistema apresenta um plano de melhoria contínua.

4) Integração / Dados Abertos

O sistema deve se integrar com as outras ferramentas que você usa. De preferência, possui integrações automatizadas. Afinal, pode ser uma perda de tempo ter que converter formatos de dados para poder trabalhar com eles. Após as análises, o sistema deve permitir que você exporte facilmente dados em diferentes formatos para atender a diferentes casos de uso.

As smart water management e as palavras de economia circular são buzzwords?

Sim, ambos os conceitos são palavras-chave, mas também são mudanças necessárias. Eles promovem soluções para diversas questões de gestão da água, permitindo um aumento na disponibilidade de água, eficiência econômica e ambiental. No entanto, é importante ter cuidado com os trending topics e evitar implementá-los de uma forma que cause mais problemas do que soluções. Quando bem implementados, contribuem para uma melhor gestão da água e proporcionam segurança hídrica a todos.

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